quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

AS PRENDAS DA CASA COR-DE-ROSA

É normal nesta época do ano oferecer-se prendas. Algumas são umas ricas prendas, destilas tu o veneno que te vai nas veias sobre o momento actual que vivemos. Como esperas um ano de 2011 bem pior que os anteriores começas a praguejar sobre tudo e sobre todos. Ninguém te escapa e como só nós os dois é que sabemos o que ainda falta fazer pomo-nos a tentar fazer de pai natal e a carregar o nosso saco de (des)ilusões com as prendas para oferecermos aos bem aventurados do nosso burgo. Colocamos as renas no trenó, vestimos os fatos vermelhos, sacudimos as gotas de orvalho (sim, falta-nos a neve) das barbas e cabelos brancos e aí vamos nós. Vai ser fácil entregar as nossas lembranças porque nestas terras do trevim mora quase tudo na mesma casa cor-de-rosa (não confundir com o Palácio Cor de Rosa de Buenos Aires).
Não queremos ser como o pai natal de Clemente Clark Moore, professor de literatura grega em Nova York e que popularizou e celebrizou a personagem vermelha de barbas brancas que se faz transportar não de metro, não de comboio mas sim de trenó puxado por renas, ao escrever o poema para os seus seis filhos intitulado Uma Visita de São Nicolau. Ao contrário do bom velhinho não vamos entrar pela chaminé da casa mas pela porta principal.
Deixamos aqui nos Paços quase todas as prendas. Em cima da secretária do Presidente deixamos o livro de Antoine de Saint Exupéry, O Principezinho. Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer… E foi então que apareceu a raposa! Logo ali ao lado para o Vereador do Desporto nada como um bom filme. Um homem à deriva consegue arranjar um combate substituindo um pugilista lesionado. Apesar de levar uma tareia é seduzido pelo mundo, pelo sucesso. Deixamos o homem-desporto a ver O Grande Ídolo de Mark Robson. Estávamos nós a chamar quase pelos bombeiros para nos tirar pela janela pois já havia bastante fumo na chaminé da sala quando encontramos o gabinete do vereador dos Homens da Paz e da Floresta. Para o jovem turco nada melhor que um estudo do Governo de S. Paulo, Brasil, sobre Planeamento Ambiental Estratégico e Educação Ambiental, A Floresta, Um Mundo de Relações. Qualquer vida é muito dentro da floresta, está escrito num poema índio. Talvez seja.
Zás! E Estamos no espaço do jovem com capacidades invulgares (espelho meu…) no campo das ciências da educação e que o qualificam como génio. Para ele um filme de Gus Van Sant, O Bom Rebelde. E como as senhoras são as primeiras nada melhor do que colocar a vereadora da saúde a pensar Como o Estado Gasta o Nosso Dinheiro. Um livro de Carlos Moreno porque fala de indignação privilegiando uma informação séria num país onde vale tudo e onde tudo continua a valer.
Já agora deixamos para os vereadores da oposição um livro de contos infantis onde relevamos o conto de Hans Christian Anderson, O Patinho Feio. Saímos pela porta das traseiras e para nosso espanto aqueciam, em fogo brando, umas palavras de ordem dos Cidadãos da Lousã e em lume mais activo A Comissão de Utentes do Ramal da Lousã. A eles deixamos uns CD’s do Maestro Metropolitano, Fábio Luisi, director artístico da Ópera Chic de Milão.
Caminhando nas ruas do burgo encontramos o Presidente da Assembleia Municipal a quem, sem qualquer conotação evidente, ofertamos o livro Viagem à China de Gilson Barreto. Sempre adorou uma aventura e nada melhor que uma civilização milenar para grandes descobertas. Olha que também temos deputados da Nação aqui na terra. Ao futuro, ex ou ex-futuro deputado candidato a qualquer coisa deixamos um filme brasileiro de Lírio Ferreira sobre a vida e obra do deputado federal Humberto Teixeira, O Homem que Engarrafava Nuvens.
Para o fim ainda sobraram umas recordações às forças políticas daqui. À CDU, para tornarem a colorir os locais da vila, nada como um livro para colorir, As Aventuras da Abelha Maia, de Waldemar Bonsels. Ao CDS o filme, adaptação livre de nós os dois, Sozinha na Lousã e para o BE um filme de Dulce Morat, Doces Poderes.
Para nós os dois que vamos fazer em 2011 o que ainda não foi feito nada como um poema de Vinicius de Moares: De manhã escureço / De dia tardo / De tarde anoiteço / De noite ardo. Nasço amanhã / Ando onde há espaço / Meu tempo é quando. Um bom ano de 2011.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

O PAI NATAL E O MENINO

Nós os dois entre dois licores preparados com produtos naturais cá da terra a partir de uma dupla destilação de plantas e sementes aromáticas, digerimos uma canção que podia ser da época que atravessamos mas que nos faz pensar. Os meninos à beira da fogueira vão aprender coisas de sonho e de verdade. Como é linda a canção que trauteamos enquanto um bando de pardais à solta percorrem os caminhos do burgo.

Este é o tempo que devia ser de paz mas, só nos faltava esta, assistimos a uma luta entre os defensores do Menino e os do Pai. Por mim, afirmo já, sou a favor do Pai porque é vermelho, faz exercício físico, anda de transportes não poluentes, tem um aspecto respeitável, alegra os meninos e ainda deixa ficar presentes. Detesto quando há grupos organizados a denegrir a imagem do Pai. O Menino tem tempo para crescer e também há-de ser pai.

Estávamos nós nesta conversa natalícia quando nos chega um documento à mesa dos sonhos, o relatório do Centro de Estudos Innocenti da UNICEF que nos faz estremecer. O “Report Card 9 – As Crianças que Ficam para Trás (The children left behind)” – conclui que as crianças em muitos países ricos da Europa e dos Estados Unidos sofrem de maior desigualdade do que as crianças de outros países industrializados. Este estudo compara, pela primeira vez, 24 países da OCDE (Organização para a Cooperação Económica e Desenvolvimento) em termos de igualdade na saúde, educação e bem estar material das crianças. O estudo divulgado no início deste mês revela que países como a Itália, Estados Unidos, Reino Unido, Grécia e Portugal estão a permitir que as suas crianças mais vulneráveis fiquem muito mais para trás, com consequências sérias de desigualdades, economia e sociais do que outros como a Dinamarca, a Finlândia, a Irlanda, a Suiça e a Holanda.

Num momento em que o discurso sobre medidas de austeridade e cortes em gastos sociais tem vindo a subir de tom, este relatório coloca o enfoque nas centenas de milhares de crianças que correm o risco de ficar mais pobres nos países mais ricos do mundo. E Portugal é o país da OCDE com maior taxa de pobreza infantil. Ora bolas, lá estamos nós à frente de um indicador em que devíamos ficar mais para trás. Lemos ainda, que um pequeno grupo de países, Dinamarca, Países Baixos, Suiça e Finlândia, estão à frente na promoção da igualdade no que diz respeito ao bem estar das crianças. Por outro lado, Estados Unidos, Grécia e Itália são os países que estão a deixar as crianças mais desprotegidas.

Portugal, Grécia e Espanha são os países com os mais elevados níveis de desigualdade. As desigualdades no desempenho educativo das crianças em matéria de literacia em leitura, matemática e ciências são menores na Finlândia, Irlanda e Canadá e mais elevadas na Bélgica, França e Áustria. Portugal, Noruega e Países Baixos apresentam os níveis mais baixos de desigualdade na Saúde. Os custos mais pesados destas desigualdades são pagos pela própria criança. A desigualdade que empurra a criança para a base da pirâmide acarreta uma série de custos que os contribuintes terão de pagar mais tarde sob a forma de aumentos de pressão sobre os serviços de saúde, o ensino recorrente e a assistência social.

Para que o combate à pobreza infantil seja um elemento central das estratégias e políticas nacionais o bem estar das crianças deverá constituir uma prioridade em todas as áreas governativas. Deve-se utilizar melhor os benefícios e deduções fiscais concedidos às famílias a fim de diminuir o fosso da desigualdade. Diminuindo estas desigualdades temos uma maior probabilidade de diminuir os problemas da nutrição, do menor desempenho educativo, do stress crónico e do desenvolvimento.

E nós os dois vamos fazendo o que ainda não foi feito, denunciando, julgando cumprir o nosso tempo, termos dúvidas, muitas e memórias, algumas. E chega-nos à memória um escrito de Fernando Pessoa que nos diz: “ Dizem que finjo ou minto tudo o que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração”. E o frio deste ano parece ser mais e pior do que o de anos idos.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

DIGO EU E DIZES TU

Estamos mal de tudo ou quase tudo, dizemos nós enquanto o frio aperta cá em cima nesta Serra coberta de branco e tu me dizes que cá se vai andando com a cabeça entre as orelhas. Parece até daqueles diagnósticos médicos que se fazem e onde o doente não tem hipótese de sobrevivência mas que se diz à família que enquanto há vida há esperança. E temos todos que ter esperança. Mas digo eu e tu concordas que sem saúde não há liberdade e que só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão, habitação, saúde, educação.

E se todos concordamos em que o Serviço Nacional de Saúde foi das maiores conquistas do vinte e cinco do quatro bem como o Poder autárquico, também sabemos que tal como o direito à informação, o direito à saúde marca a diferença entre existir ou não existir. Sem informação não há vida e viver sem saúde é uma calamidade.

Conquistada a liberdade política há 35 anos, Portugal anda a construir as condições que a suportam tendo como direito fundamental a saúde. Temos hoje equipas de saúde espalhadas por todo o território nacional, tentamos fazer uma reforma na saúde que servisse de marco histórico das reformas em Portugal e na Europa, continuamos a dar expressão ao que de mais essencial tem a liberdade, temos hoje números em saúde idênticos aos da Europa, somos dignos dos maiores elogios nas instâncias internacionais porque conseguimos os mais altos índices de desenvolvimento humano reduzindo drasticamente a mortalidade materno infantil e aumentando a esperança de vida para valores nunca conseguidos.

E se houvesse heróis esses eram os enfermeiros, os médicos mas também todos os profissionais da saúde que contribuíram para que fossem colocados em todo o território nacional os Cuidados de Saúde Primários como parceiro estratégico da liberdade. Os portugueses puderam, assim, escolher o seu médico de família, a sua equipa de saúde, e criaram as condições imprescindíveis de serem mais saudáveis. E hoje a Saúde tem que fazer uma aliança estratégica com a Educação e o Ambiente de forma a que todos possamos aprender a não delapidar os nossos recursos e a impedir que outros o façam, mesmo que os abutres sejam os grandes grupos económicos ou agentes políticos que nada fizeram ou contribuíram para a plenitude da nossa liberdade.

Falta fazer muita coisa a nível mundial mas também em Portugal. E tu recordas-me um texto de um jornalista lá da minha banda, Angola, José Ribeiro, que afirma que “andar à frente do tempo só faz sentido, tal como a liberdade, quando existem como suporte as condições mínimas que garantam a dignidade humana. Num tempo em que prevalece o ter sobre o ser, os valores que fazem um ser humano sentir-se livre nem sempre estão garantidos e quase sempre são negados” Que no próximo ano os nossos políticos e o Governo reforcem as suas decisões estratégicas e que dêem mais valor às áreas sociais e, particularmente, à Saúde.

Não matem o que de bom foram construindo neste últimos anos porque muitas das vitórias deste povo e dos seus governantes merecem figurar como emblema de quem se preocupou em resolver os problemas nacionais. E tu e eu o que vamos fazer? Talvez continuarmos atentos.